sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Poema do que não existe

Lindo com o Belo,
Esplendoroso de tão maravilhoso,
Excelente por ser delicado,
Ora amado, ora odiado,
Péssimo de tão grosseiro,
Sujo por ser asqueroso,
Tão feio quanto horroroso,

Bipolar, mas inteiro!

Poema de resposta: À Kafka

Por sua culpa,

Adquiri alergia aos papéis amarelados,
Às gavetas dos arquivos
E aos carpetes mofados.

Tenho medo das cadeiras das salas-de-espera,
Dos corredores escuros
E das portas entreabertas.

Evito areia movediça,
Conversa escorregadia
E a sede da justiça.

Não confio mais no que vejo
Na TV, na internet, no espelho,

Tampouco no que leio ou escrevo.

Cartografia da nostalgia

Como eu queria que toda rua fosse Da Alegria, Da Amizade ou Da União.
Que as ruas não fossem jamais Da soledade ou Da Angustura.  
Que toda Aurora fosse Do Sol.
Que a rua Da Luta se tornasse enfim Da Vitória ou Da Glória.
É que, Do Alto da Saudade, lembro de quando as ruas eram só Idas, ainda não havia os retornos Do Progresso.
Tinha rua Do Passarinho, Dos Coelhos, Do Lírio, Do Jasmim, avenida que era Floresta, tinha Flores, Pinheiros, Esperança, Mangueira e Carneiro que não era Vilela.
Toda Estância era vista do Alto da Bondade.
Não precisava ser Dois Irmãos para ser Dois Unidos, tampouco existia nessa época Linha do Tiro. Peixinhos nadavam em Aguazinha e Jardim Primavera era do lado de casa.
Nessa época a  Beira Rio era dos Navegantes e o encontro do Rio com o Mar se dava no Cais do Apolo.
No tempo Da Saudade e do Sossego, onde tudo era Concórdia, já dizia o Velho Chico, acho que a gente nem tinha nascido. 

Trajeto à direita


Saio da Rua Em Que Moro, no sentido para onde não tem praia e viro à Direita na rua dos Azulejos Brancos. Cruzo a Avenida Dos Engarrafamentos e sigo pela Rua Da Academia. Dobro na Pracinha Malcuidada e pego a Rua Da Padaria Cara. Sigo reto desviando dos buracos, das bicicletas, dos homens-jumento, dos carros estacionados, dos que vêm em sentido contrário e dos pedestres sem calçada.
Desvio do cachorro sem dono.
Viro à Direita no sinal vermelho. Estou na Rua dos Sinais. Todo sinal é vermelho quando chega minha vez. Será um sinal? Espero. Autômatos noutros carros. O sinal ainda fechado.É preciso botar a máquina para rodar..., acelero, buzino, xingo, grito, corto e vôo, interessa é chegar. Mais um sinal, não desisto, viro à Direita e sigo...na Rua da Meritocracia, onde meretrizes ensinam os valores da sociedade ao nascer Da Aurora.
Aurora que nem mais atinge o quarteirão, bloqueada pelo paredão de cimento. Diminuo a velocidade, a cancela sobe, adentro um bloco de concreto, mas um dia de objeto.

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Nostalgia

De ver o sol nascer
De dormir ao amanhecer
De nadar na ressaca do mar

Dos futuros incertos
Dos planos de casamentos
Dos sonhos com apartamentos

Da rosa com espinho
Da manga com fiapo
Da flor do beija-flor

Saudades do beija-flor!



Voa Juquinha II - 2016

Voa Juquinha,
Você está livre.
Voa – voa, à tona, à toa...
Usa tuas asas e ganha essa imensidão.

Decola, larga esse chão...
Meu passarinho, menininho
Que ficou velhinho, sem ser.

Vai cantar noutras árvores e ser feliz.
Se não fosses aqui, quem sabe ali?
Entre palhaços e bruxas, bolinhas e carrinhos,
É assim que vejo a ti.

Deixa nessa terra as lembranças amargas,
Que pela tua carne foram engolidas
E que pelo tempo serão digeridas.

Estás livre de todas as marcas.
Acabaram-se tuas dívidas.
Vai, bate essas asas!

Quero te ver misturado no céu
Verde, azul, branco, rosa, laranja, vermelho, amarelo...

Voando ligeiro, voando liberto.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Controle

Entre a parede,
o muro
e a cerca,
Fronteira.

Entre o condomínio,
o carro
e o campo de concentração,
Prisão.

Entre o relógio,
o chefe
e o salário,
Amargo.

Entre o que fui,
o que sou
e a ânsia,
Vigilância.

curta!

curta a ilusão
curta a razão
curta a dor
curta a alegria
curta a poesia
curta a vida!

sofá

sofá
so far
stars
a piscar
ar
respirar
sofá
so far...

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Areia Azul

Às vezes é preciso se afastar para se ver de perto.

Foi caminhando que cheguei à Areia Azul. Não lembro ao certo qual verão foi, mas era verão. Entre o céu e o mar, tudo era areia e suor. A areia para se embalar de céu, o suor para alimentar o mar.

Perdi às contas de quantos passos são necessários para conhecer Areia Azul inteira. Às vezes um, nenhum, mil, depende. Areia Azul se apresenta diferente para cada visitante. É que as areias estão sempre em movimento.

Areia Azul se localiza exatamente entre o que foi e o que pode vir a ser.  Lá o tempo é salgado. Seja noite, seja dia. Ora é seco, ora é molhado. Só que na areia é demorado e no mar passa apressado.

Em Areia Azul aprendi que o azul pode ser preenchido de várias formas e de várias cores. Pode ter peixe ou pássaro, ser branco ou ser laranja.... As areias me mostraram como não se repetem as ondas.

E as ondas carregaram minhas certezas, se foram na correnteza. 


Eu, nada a fazer, observei. 

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Novamente

Nas paredes manchadas por histórias,
Na ausência dos móveis da casa,
No ruído das lembranças que ficam...

Abro a janela...
O vento a varrer o apartamento.
A tinta a limpar os pensamentos.



Pela janela

Olho pela janela,
um arrepio
e o vento a passar.
Olho pela janela,
vem o frio
e o cheiro de terra molhada no ar.
Olho pela janela
os passarinhos
entre verde-claros a voar.
Olho pela janela
e o sol
a esquentar.
Olho pela janela,
mas mais um ano a passar...

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Vírus

Multiplicam-se como praga,
entranham-se na natureza,
sugando a vida, a riqueza.

Deixam atras de si um rastro,
percurso amargo
de um chorume ácido.

Ácido, como os percentuais dos homicídios
e os imperativos econômicos do capitalismo.

Ácido, como a erosão das entranhas das células,
dos corpos, da terra.

Ácido, como os esgotos-mares
as fumaças-nuvens e os trabalhos-ataúdes.

Parasita do planeta,
predador de todas as espécies,
vírus, metamorfoseado de mamífero.

Por um viés altruístico,
percebo nosso auto-extermínio.



terça-feira, 17 de maio de 2016

domingo, 15 de maio de 2016

Divagações noturnas

eu poderia pintar a casa de preto
pintar até o espelho
porque os olhos são traiçoeiros
me enganam.

mas penso se não ver
seria insensatez?

Me levanto,
acendo a luz
e opto pela lucidez.

Notas sobre este poema

Este poema deve ser queimado vivo!

As idéias aqui escritas são os frutos proibidos
de uma mente inútil, livre e de difícil acesso.

O autor apresenta comportamentos de elevada periculosidade:
- Não assiste televisão
- Não passeia no shopping aos domingos
- Não toma dinheiro emprestado
- Não frequenta igrejas e nem é viciado
- Trabalha somente o necessário para justificar o ordenado
- Ah! E caminha sem direção nos dias de folga.

Assinado

Glória


Pardais

Escuto, de minha gaiola,
o canto eufórico dos pardais
que se deliciam bicando a própria carne

arde, arde, arde, arde...

Bebem do próprio sangue
sem perceber que estão crucificados,
Rezam pelo Salvador
e se entorpecem na própria dor.

A Natureza

A natureza,

Palavra tão feminina,
Bela, como um furacão,
Recatada, como um tsunami,
Do lar, como um terremoto,
Procura manter limpa a casa,
Mas, às vezes, esquece alguns cômodos.

Zoológico

Milhões de jumentos
disputam o que resta de grama
na lama do planalto

Ratos por todos os lados,
na piscina, na sala, no templos,
nos escritórios e departamentos

Hienas riem alto,
antevendo a carnificina
dos combates nas esquinas

Enquanto isso, as raposas
gerenciam o galinheiro:
Ponham mais ovo!

Física Quântica

Pode o acelerador de partículas
acelerar o tempo de nossas vidas?

Não quero viver o peso
de poder ser preso
por ter idéias contra-ditas
Duras que me vincam a testa,
que não é de ferro,
senão carne  sangrenta
de um corpo censurado
na liberdade da ordem
e do pró-regresso

quinta-feira, 10 de março de 2016

Famintos

Um pão envelhecido
com sabor de domingo
preenche esse buraco de

A água nunca é dada,
ora doce, ora amarga
sem fluir nesse rio de

Até o fruto, que de longe
se vê a cor e de onde,
incolor, cai do pé de...

Desordem

A fumaça do café
O cheiro de naftalina
Brigam por comida os pardais
Carros dobram na esquina...
Sobre as  roupas, o catarro
O gato pula excitado
Crash!Praaaaa!Beeeeeeeep! wwwwwwhhhhoooooo!
Ai! Queimei a língua